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Sob a ótica dos pescadores: impacto das hidrelétricas de Jirau e Santo Antônio sobre a biodiversidade do rio Madeira é revelado em estudo multi-institucional

Publicado: Quinta, 30 de Janeiro de 2020, 17h03 | Última atualização em Sexta, 31 de Janeiro de 2020, 16h14 | Acessos: 5883

Os entrevistados perceberam um importante declínio na produtividade da pesca depois do barramento do rio. Mudanças na condição do peixe também foram percebidas, incluindo redução no peso ou comprimento e ciclo reprodutivo irregular

Por Cristiane Souza
Equipe Ascom Ufam

Uma série de artigos que aborda os impactos ambientais das hidrelétricas do complexo de Jirau e de Santo Antônio, localizadas em Rondônia, sobre a biodiversidade do rio Madeira teve a participação do professor da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), Rogério Fonseca, e de pesquisadores de outras três universidades federais. O mais recente deles, cujo título é “Damming Amazon Rivers: environmental impacts of hydroelectric dams on Brazil’s Madeira River according to local fishers’ perception” (Represando rios amazônicos: impactos ambientais de barragens hidrelétricas no Rio Madeira de acordo com a percepção dos pescadores locais), foi publicado no periódico da Royal Swedish Academy of Sciences 2020, Ambio, neste mês de janeiro.

Segundo o pesquisador Rogério Fonseca, membro do Núcleo de Estudos Avançados e Interdisciplinares em Recursos Hídricos da Universidade Federal de São João Del-Rey (UFSJ), em Minas Gerais, o objetivo do grupo é compartilhar os resultados com o máximo de pessoas. “O rio Madeira é responsável por 20% de todo o volume da Bacia Amazônica, além de ser o mais biodiverso dentre os afluentes do rio Amazonas”, justifica o professor do Departamento de Ciências Florestais da Faculdade de Ciências Agrárias (FCA) da Ufam ao prospectar o alcance da investigação.

“A Ambio é uma das revistas da área socioambiental com maior impacto de leitura no planeta. É dizer que um artigo publicado nessa revista representa muito para a ciência produzida em nossa região, já que optamos por fazer parte de uma equipe multi-institucional e exogênica, justamente para evitar tendenciosidade e capciosidade numa investigação que possui relevância nas mais diversas áreas científicas (ciência atuarial, econômica, jurídica...)”, dimensiona o professor Rogério Fonseca.

O periódico aborda os fatores científicos, sociais, econômicos e culturais que podem influenciar a condição do ambiente humano. Em particular, a Ambio incentiva o envio de trabalhos multidisciplinares ou interdisciplinares. Com 45 anos de existência, ajuda a ampliar as perspectivas internacionais em temas como ambiente, políticas e atividades relacionadas, fomentando o acesso a especialistas, generalistas, estudantes, tomadores de decisão ou leigos interessados.

Cooperação Multi-institucional

Além dele, são coautores do estudo outros três pesquisadores que cooperam em trabalhos conjuntos no âmbito do Nacqua-UFSJ: os professores Rangel Eduardo e Maria Auxiliadora, ambos da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG); o professor Ricardo Mota, da própria UFSJ; e o professor Fabrício Berton Zanchi, ex-docente da Ufam que leciona hoje na Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB).

O Núcleo é coordenado pelo professor Ricardo Motta Pinto Coelho e tem suas atividades operacionalizadas pelo professor Rangel Eduardo Santos. Da parte do professor da Ufam, seu trabalho tem sido disponibilizar dados de campo e realizar avaliações e palestras correlatas ao tema, dentre outras formas de cooperação.

Em dezembro de 2019, o pesquisador Ricardo Motta Pinto Coelho esteve em Manaus, onde proferiu uma palestra sobre a gestão dos reservatórios e das barragens brasileiras. A atividade foi parte do calendário acadêmico do Programa de Pós-Graduação em Ciências Florestais e Ambientais (PPGCifa). “A temática da palestra foi oportuna, já que uma das atribuições dos Engenheiros Florestais é o gerenciamento de bacias hidrográficas”, pontua o coordenador do PPGCifa, professor Ricardo Fonseca.

A Bacia Amazônica e o Madeira

Segundo a Agência Nacional de Águas (ANA), a Bacia Amazônica banha oito países, embora 64% dela esteja em território brasileiro, representando cerca de 80% do volume de águas do País. Desde a nascente, na Cordilheira dos Andes (Peru), o rio Amazonas tem vários nomes, dentre os quais Apurimac, Ucayali, Marañon e Solimões.

Maior rio do planeta em volume de água, o Amazonas tem comprimento estimado em 6,9 mil quilômetros e lança, a cada segundo, uma média de 210 mil metros cúbicos de água e 31 toneladas de sedimentos no Oceano Atlântico.

Os números são grandiosos, assim como os impactos sofridos pelo seu maior afluente, o rio Madeira, cuja extensão chega a 1,7 mil quilômetros somente no território brasileiro e a vazão média é de 23 mil metros cúbicos por segundo. “Nesse contexto, 20% de vazão alterada ou afetada representa sucessivos problemas ambientais e econômicos. A navegação e a pesca sofrem as consequências mais visíveis, já que influenciam a economia do nosso Estado”, esclarece o professor Fonseca.

Essas referências são fundamentais para entender a importância do último estudo e perceber a dimensão dos impactos ocasionados pelas duas grandes hidrelétricas construídas no Brasil – Jirau e Santo Antônio. Ainda que ambas as hidrelétricas estejam localizadas em Rondônia, o estado Amazonas é um que mais sentem as mudanças ambientais causadas pelas usinas. O setor pesqueiro, segundo eles, é o mais atingido.

Nesse trabalho mais recentemente publicado pelos professores, em resumo, eles “avaliam os impactos das hidrelétricas de Santo Antônio e Jirau (Rio Madeira-Amazônia) sobre a atividade pesqueira, os peixes e os ecossistema aquáticos amazônicos através da percepção de pescadores locais”. Em se tratando do ecossistema aquático, “a mudança no ciclo hidrológico” foi o aspecto mais apontado pelos entrevistados.

“Todos os pescadores locais perceberam um importante declínio na produtividade da pesca depois do barramento do rio Madeira. Mudanças na condição do peixe também foram percebidas, incluindo exoftalmia [protuberância do globo ocular possivelmente causada pela passagem dos peixes pelas turbinas hidrelétricas], redução no peso ou comprimento do peixe e ciclo reprodutivo irregular”, argumenta o pesquisador da Ufam participante do grupo multi-institucional sediado na UFSJ.

Outros trabalhos

Ainda em 2011, o professor Rogério publicou, também em coautoria, um artigo no qual tratou a questão do desembarque pesqueiro na cidade de Humaitá. Conforme recorda o docente, esse foi trabalho responsável por “despertar o interesse e trazer a luz” que conduziu ao estudo dos impactos ambientais das hidrelétricas a partir de uma perspectiva metodológica que considera os pescadores locais.

A seguir, está disponibilizada a referência completa ao texto, incluindo o link do periódico onde se encontra a publicação original: Sales; Zanchi; Fonseca, Rogerio; Santos. Caracterização do desembarque pesqueiro efetuado na colônia de pescadores Z-31 no Município de Humaitá-AM. Igapó (CEFET-AM), v. 5, p. 1, 2011.

Sete anos depois daquela primeira incursão no tema sobre o qual a equipe se debruça hoje, foi publicado um texto mais específico, cujo escopo foi estudar o declínio da atividade pesqueira no rio Madeira, com maior destaque na costa direita onde se situam as hidrelétricas de Jirau e Santo Antônio. No texto, os autores expõem o que chamam de “custo” da construção das usinas naquela região.

Para saber o quanto as duas grandes obras de geração de energia custaram para a pesca naquela região – segundo o ponto de vista acadêmico dos pesquisadores do Nacqua – basta ler este artigo cuja referência é esta: Dos Santos; Pinto Coelho; Fonseca, Rogerio; Simões, N. R.; Zanchi. The decline of fisheries on the madeira river, Brazil: the high cost of the hydoreletric dams in the Amazon basin. Fisheries Management and Ecology, v. 5, p. 380-391, 2018.


Fotos: Rangel Eduardo Santos

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