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Professora Iraildes Caldas Torres ascende a titular da Ufam

  • Publicado: Sexta, 27 de Dezembro de 2019, 18h16
  • Última atualização em Quinta, 20 de Fevereiro de 2020, 15h53
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Com uma trajetória acadêmica que supera três décadas de dedicação, lutas e conquistas para a Universidade, para o Amazonas e para toda a sociedade, a professora Iraildes Caldas Torres teve sua história coroada pela ascensão à classe de Professora Titular, última a ser alcançada na carreira do Magistério Superior. A defesa, ocorrida na tarde de sexta-feira, 27, no auditório Rio Solimões do Instituto de Filosofia, Ciências Humanas e Sociais da Universidade Federal do Amazonas (IFCHS/Ufam), foi marcada por um discurso emocionado, permeado por canções e histórias que retrataram a vida e a obra da docente. Familiares, amigos e orientandos acompanharam a apresentação.

Antes mesmo de começar a explanação, a oradora exibiu para o público e os avaliadores um vídeo de dez minutos no qual procurou resumir um pouco sua trajetória por meio de fotos, músicas e outras recordações. Em seguida, ao iniciar a oratória, usou a metáfora do rio, da vida como um rio, ao longo do qual os principais períodos foram chamados por ela de banzeiros. “Este memorial tem três banzeiros, porque foram as águas me trouxeram até aqui, e são elas que me acompanham ainda hoje pelos rios labirínticos da Amazônia, onde eu faço pesquisa”, explicou a professora Iraildes Caldas aos ouvintes.

A banca, segundo ela mesma esclareceu, foi composta por docentes que tiveram com ela importantes aproximações quando do seu trabalho investigativo. “Ainda enquanto professora auxiliar, em 1993, eu ingressei no estudo do gênero, com um trabalho sobre as mulheres operárias, as mulheres metalúrgicas. Tive um grande apoio da professora Marilene Corrêa da Silva naquele primeiro momento nesta Universidade. Hoje, ela preside esta banca”, rememorou a docente.

“O professor Vicente de Paula, da UNB, é um ícone do curso de Serviço Social ao qual é vinculado”, ressaltou, referindo-se a um dos membros externos da Comissão avaliadora. Outro pesquisador de muita importância para ela, antropólogo e etnólogo Carlos Alberto Marinho Cirino (UFRR), é um dos principais estudiosos de etnias em Roraima. Já a professora Rosa Ester Rossini (USP), é uma pesquisadora que marcou o início da trajetória acadêmica da professora Iraildes: “Ela é um ícone na formação de pesquisadores, e a Iniciação Científica foi uma criação desta professora aqui conosco. Iniciar com a pesquisa na graduação é o que nos prepara para a vida acadêmica”.

Para o professor Raimundo Nonato Pereira da Silva, diretor do IFCHS, esta é mais uma importante banca de defesa para professor titular. "Nós já tivemos a professora Márcia Eliane, a professora Patrícia Melo, o professor Sérgio Ivan Gil Braga, a professora Marilene Corrêa, o professor José Aldemir (já falecido), o professor Ricardo Nogueira. No próximo ano, serão outros professores do Instituto se tornando titulares", disse.

"O que acontece? O primeiro dado importante é que estamos lidando com um processo geracional, então, muitos dos que eu citei estão dentro de gerações próximas. Esse coroamento marca uma trajetória de vida acadêmica dedicada exclusivamente à produção de cada um desses docentes, tanto do ponto de vista da pesquisa, quanto do ensino e da extensão, ela é um coroamento do que é o tripé da Universidade. Além do mais, todas essas pessoas tiveram, direta ou indiretamente, participação na parte administrativo-acadêmica. Todos os nossos titulares também são referências dentro e fora da Ufam, sem contar que formaram gerações de pesquisadores desde a graduação, com a iniciação científica, até o doutorado. Mais do que isso, é relevante estar ciente do impacto dos trabalhos realizados por esses professores na sociedade amazonense e em todo o País", completou ele.

Os três banzeiros

Retornando à metáfora dos banzeiros que trouxeram a professora Iraildes Caldas até este momento de ápice na carreira docente da Universidade Federal do Amazonas, eles são assim definidos por ela. “No primeiro banzeiro, exponho a minha infância e as escolhas, o chão de rio e os ladrilhos da selva, a vida no convento religioso, o curso de Serviço Social e a resistência estudantil. O segundo banzeiro expõe o divino ofício de ensinar, a investigação científica e a extensão universitária. O terceiro banzeiro traz os cantos de trabalho, as teorias e as descobertas, a gestão na pós-graduação e na editora de nossa universidade”, enumerou a oradora, ao se referir a cada uma das fases de sua vida.

“Nasci em 1962, tempo em que os ventos da modernidade afastavam o País para o propalado desenvolvimento. Nasci numa fazenda de animais bovinos no rio Paraná do Ramos, um braço do rio Amazonas”. Ainda criança, ela já se intrigava sobre como as brincadeiras eram binárias, e percebia que as meninas trabalhavam mais que os meninos. A mãe trabalhava na roça, além de cumprir todos os afazeres domésticos. Mais tarde, veio a compreender que isso se tratava de uma divisão social de papeis. “Esse foi o gérmen que me conduziu uma vida toda de investigação sobre as mulheres trabalhadoras como objeto de estudo”, resgatou a professora.

Ela estudou em Maués até parte do primário e, aos 12 anos, veio a Manaus para estudar e seguir a vida religiosa com o noviciado. “Isso se manifestava, para mim, como uma vocação. Ao chegar à antiga escadaria dos remédios, hoje Manaus Moderna, deparou-se com uma grande quantidade de peixes mortos. Naquela imagem, eu senti uma decepção, um grande impacto a respeito da morte dos peixes”. Pensou em desistir, em voltar, mas não o fez. “Naquele período, eu morei em casas de três pessoas, só porque eu precisava estudar. Era o trabalho doméstico em troca da morada, até que o cônego Walter Gonçalves Nogueira me acolheu como uma filha”, recordou-se.

Ainda naquele primeiro banzeiro, escolheu seguir a vida religiosa, cursou Filosofia e Teologia pelo Instituto Superior de Filosofia, Teologia, Pastoral e Ciências Humanas da CNBB, onde formou as bases da formação humanística e hermenêutica que mantém até hoje. Com o Frei Clodovis Boff, ela aprendeu que Deus é masculino e feminino. “Foram influências que trouxe dessas duas formações. Com elas, tive a visão de mundo mais abrangente, que me preparou ainda mais para falar sobre os enfrentamentos que eu viria a estudar na graduação em Serviço Social, no mestrado, no doutorado e nos pós-doutorado”, acrescentou a professora.

Os banzeiros foram avançando, e com eles as resistências se tornaram mais claras e fundamentadas, tornaram-se pesquisas e indagações acadêmicas. A vida de religiosa teve fim depois de algumas manifestações sociais, a exemplo de uma greve da educação básica, da luta pela meia passagem estudantil, do ativismo político em prol dos metalúrgicos, etc. Nesse período, a jovem Iraildes Caldas foi presidente do Centro Acadêmico de Serviço Social e vice-presidente do Diretório Central dos Estudantes (DCE). Durante essa graduação, houve o reencontro com a temática de gênero.

A trajetória como pesquisadora consolidou-se com o passar dos anos, até alcançar a maturidade. “Após finalizar a graduação, veio o Mestrado em Educação, onde discuti o papel das primeiras damas e a assistência social. Problematizei a falta de preparo, forte crítica à atuação assistencialista, publicado pela Cortez, em 2002”, recordou. O doutorado foi cursado na PUC SP, onde ela trabalhou com a temática das mulheres operárias que lideravam as grandes greves no Distrito Industrial. “Questionei a invizibilização dessas mulheres pelos sindicatos, toquei essa ferida”, ressaltou a professora.

Mais recentemente, em 2014, cursou o pós-doutorado na Universidade de Lion II, com o tema da micropoética das mulheres Sateré-Mawé. O título do trabalho remete à estética e à cultura ancestral dessas mulheres, enfatizando as práticas sociais de gênero na Amazônia. Além disso, ao longo desses banzeiros, a professora também expôs, pela extensão universitária, a realidade das lutas sociais no Amazonas. “Atuei em temas como organização de comunidade e movimentos sociais, potencializando e qualificando a intervenção social”, disse a oradora, que, ao final das colocações dos membros da Comissão, passou a compor o seleto grupo de docentes titulares da Ufam.

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